Vivemos um tempo em que liderar vai muito além de bater metas ou entregar resultados. Com tantas mudanças acontecendo ao mesmo tempo — da pandemia que virou o mundo de cabeça para baixo, até as crises econômicas, conflitos geopolíticos e avanços tecnológicos que não param — é natural que inseguranças e incertezas tomem conta do ambiente de trabalho. Nesse cenário, repensar o papel da liderança deixou de ser uma escolha: virou uma necessidade. Cada vez mais, cresce a demanda por lideranças que consigam enxergar o ser humano por trás do crachá — com suas angústias, seus valores e suas buscas por sentido.
É aí que entra o conceito da liderança existencial, abordado por Sai Bhargavi Vedula, especialista em comportamento organizacional, no artigo “Becoming an existential leader: a leadership toolkit for existential thinking” (Tornando-se um líder existencial: um kit de ferramentas de liderança para o pensamento existencial, em tradução livre) — publicado em 2025. Ao trazer à tona temas como mortalidade, liberdade, responsabilidade, autenticidade e pertencimento, Vedula convida líderes a olharem para si mesmos e para suas equipes sob uma nova ótica: a da condição humana.
O que é liderança existencial?
Inspirada na filosofia existencialista, essa abordagem entende que liderar não é apenas alcançar metas, organizar processos ou gerir tarefas. Liderar, nesse contexto, é reconhecer que todas as pessoas — inclusive os próprios líderes — carregam dúvidas, medos, sonhos e a busca incessante por significado.
Ao invés de evitar esses temas, a liderança existencial propõe que eles sejam trazidos à superfície, criando espaço para reflexões sobre:
- A finitude da vida e o valor do tempo;
- A liberdade de escolha e a responsabilidade que ela carrega;
- A solidão e a necessidade de pertencimento;
- A autenticidade como caminho para o engajamento verdadeiro;
- O vazio existencial e a importância de construir um propósito compartilhado.
Quem não se identifica com este exemplo?
Vedula ilustra esses dilemas com a história de John, um gestor que, durante a pandemia, precisou adaptar-se ao trabalho remoto. O que parecia uma simples mudança de formato revelou-se um processo mais profundo: a perda da rotina, o isolamento, a confusão entre vida pessoal e profissional e o medo da doença geraram crises de identidade, propósito e pertencimento — não apenas para John, mas para toda a equipe.
Esse exemplo evidencia que as lideranças não são imunes às ansiedades existenciais. Ao contrário, elas precisam acolher essas questões, dentro de si e de suas equipes, como parte do processo de liderança.
No entanto, esse exercício de reflexão nem sempre é fácil — especialmente porque ele exige vulnerabilidade. E, no mundo corporativo, mostrar-se vulnerável ainda é muitas vezes confundido com fraqueza. Assim, o medo de se mostrar imperfeito, de não ter todas as respostas ou de demonstrar emoções acaba levando líderes a evitarem o mergulho necessário para compreender suas próprias angústias e inseguranças.
Mas é justamente ao reconhecer essa vulnerabilidade — e ao acolhê-la — que o líder se torna mais humano, mais acessível e mais preparado para construir relações autênticas com sua equipe. Afinal, liderar não é estar acima dos outros, mas caminhar junto, com consciência das próprias limitações e abertura para o crescimento mútuo.
A importância da autenticidade e do pertencimento
O artigo também traz a história de Maya, uma gerente que, apesar do sucesso profissional, vive um conflito interno entre os valores da empresa e seus próprios princípios. Esse desalinhamento, comum em ambientes altamente competitivos, é um alerta para o risco da perda de autenticidade no exercício da liderança.
Em 2023, a Gallup já indicava em um de seus relatórios anuais que 59% dos colaboradores se sentem desconectados do propósito da organização, o que impacta diretamente em engajamento, inovação e saúde mental. Por outro lado, ambientes que promovem autenticidade e pertencimento apresentam maiores níveis de produtividade e retenção.
Para isso, o autoconhecimento torna-se um recurso indispensável. Líderes que se conhecem profundamente — seus valores, limites, motivações e fragilidades — estão mais preparados para liderar com coerência e sensibilidade. Dessa forma, é a partir desse processo interno que o líder passa a tomar decisões mais alinhadas, construindo relacionamentos mais autênticos e espaços seguros onde as pessoas sentem que podem ser quem realmente são.
Liderar com consciência e profundidade
A liderança existencial não oferece respostas prontas. Em vez disso, propõe ferramentas reflexivas que ajudam líderes a lidar com dilemas profundos do cotidiano organizacional:
- Como acolher a ansiedade frente à incerteza?
- Como equilibrar liberdade e responsabilidade em um time?
- Como criar um ambiente onde todos se sintam vistos e ouvidos?
- Como manter o propósito vivo diante da pressão por resultados?
Segundo pesquisa do MIT Sloan Management Review (2022), empresas que adotam uma abordagem mais humana e reflexiva na liderança são mais bem-sucedidas em tempos de crise. Isso porque promovem confiança, colaboração e sentido coletivo — pilares da resiliência organizacional.
Colocando a liderança existencial em prática
A liderança existencial não é um modelo teórico distante da realidade. Pelo contrário, ela se revela em atitudes simples, porém profundas, que criam conexões mais genuínas e ambientes mais saudáveis. Veja algumas formas de aplicá-la no cotidiano:
Pratique a escuta ativa e empática
Dê espaço para que as pessoas expressem seus sentimentos, dúvidas e angústias. Afinal, ouvir de verdade é o primeiro passo para reconhecer a humanidade no outro.
Incentive conversas sobre propósito
Ajude sua equipe a conectar seu trabalho a algo maior. Pergunte o que faz sentido para cada um e como podem alinhar isso às metas do time.
Seja transparente sobre incertezas
Reconheça que nem sempre você terá todas as respostas. Mostrar vulnerabilidade com responsabilidade fortalece a confiança do grupo.
Crie espaços de pertencimento
Valorize as diferenças, estimule o diálogo e combata a exclusão. Afinal, um ambiente seguro promove conexão e autenticidade.
Reflita sobre seus próprios valores
O autoconhecimento é essencial para liderar com autenticidade. Assim, pergunte-se com frequência: “Estou sendo coerente com o que acredito?”
Celebre o tempo presente
Em meio à correria, reconhecer conquistas do agora — por menores que sejam — reforça o sentido de presença e realização.
Conclusão: liderar é existir com os outros
A liderança existencial propõe uma mudança de paradigma: de líderes que controlam para líderes que escutam; de ambientes mecanicistas para culturas que acolhem a vulnerabilidade; de metas por obrigação para propósitos compartilhados com sentido.
Ao integrar os temas centrais da existência humana na prática de liderança, criamos espaços onde é possível trabalhar com mais verdade, mais conexão e mais humanidade. E, num mundo em constante transformação, talvez essa seja a única forma sustentável de liderar.
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