Sala de aula invertida: entenda como funciona e experimente

Na integra

Por Meg Chiaramelli, head da Escola de RH e do Núcleo de Coaching da Integração

Pense em uma sala de aula na qual um professor fala e explica os conceitos o tempo todo. Como os alunos se sentem? Em seguida, imagine uma proposta em que os alunos estudam os conteúdos antes da aula, por meio de vídeos, textos e artigos sobre o assunto em pauta, e também fazem exercícios individuais – onde estiverem, fora da sala de aula – que incitem a reflexão sobre o tema e aumentem o engajamento de cada aula. Esse é o modelo que está por trás do conceito de sala de aula invertida. 

A implementação da sala de aula invertida – ou flipped classroom, em inglês – foi introduzida em 2007 pelos professores americanos Jon Bergmann e Aaron Sams numa escola do Colorado, nos Estados Unidos. O conceito de sala de aula invertida não significa a eliminação do espaço convencional, mas torna o momento de encontro entre professores – ou consultores de treinamento – e alunos em algo voltado para o esclarecimento de dúvidas, o compartilhamento de exemplos e cases e também para a prática ou a correção de exercícios. Dessa forma, o professor é muito mais ativo e tem o papel de estimular os alunos. Ele deixa, então, de exercer a função de uma pessoa que sabe tudo, um expositor, e passa a ser um tutor que esclarece, apoia e incita o aprendizado. 

O que propõe o modelo de sala de aula invertida 

Como o nome sugere, o modelo propõe inverter o método de ensino tradicional, em que o aluno atua passivamente, apenas ouvindo o professor. O método proporciona aulas menos teóricas e mais participativas, já que os alunos são estimulados a refletir sobre o conteúdo. A sala de aula invertida permite ainda que o conhecimento e a disponibilidade do professor sejam mais bem absorvidos e aproveitados. 

Nas aulas do Programa de Desenvolvimento de Liderança (PDL), eu aplico o conceito com algumas variações, ou seja, incentivo os alunos a buscar informações durante a aula. Com tantos recursos disponíveis na internet, podemos aplicar diversos conteúdos em sala, inclusive durante a aula. O princípio é o mesmo. O professor lança uma pergunta e faz com que os alunos pesquisem, conversem e façam uma apresentação associando com o que eles já viram, viveram ou ouviram falar. 

Passei a utilizar essa estratégia porque o PDL possuía uma parte muito teórica, e os profissionais se dispersavam facilmente. A princípio, eu disponibilizava 30 minutos para a pesquisa, mas nunca era suficiente, porque eles queriam ler mais, ver mais vídeos, discutir e contar suas experiências. Eles também ficavam eufóricos com a apresentação. É impressionante a participação dos alunos, a criatividade com que apresentam e a riqueza de cases que trazem.

Talvez você imagine que as apresentações sejam maçantes, pois todos os grupos vão falar sobre o mesmo assunto, e os conteúdos não variam tanto assim. Mas eu garanto que isso é ótimo! A dinâmica e a diversidade das apresentações não deixam o tema monótono. Além disso, a repetição do que é marcante é fantástica para fixar o conteúdo. No fim da aula, eu pergunto a eles o que fixaram do tópico discutido e eles sempre afirmam que entenderam todo o conteúdo.

A eficácia da sala de aula invertida

Existem pesquisas que mostram a eficácia da sala de aula invertida. Uma delas, feita pela Universidade de British Columbia, no Canadá, apontou que o método aumenta em 20% a presença em sala de aula e em 40% a participação nas aulas. As notas dos alunos também melhoraram − segundo o levantamento, elas foram o dobro das notas dos alunos que não utilizaram o método. A Universidade Harvard, nos Estados Unidos, também tem estudos que demonstraram ganhos de 49% a 74% desse modelo em relação ao método tradicional.

É comum o aluno se dispersar durante as aulas teóricas e logo utilizar o celular, muitas vezes para checar ou complementar o que está ouvindo. O que podemos fazer é justamente nos antecipar e introduzir essa curiosidade, essa vontade de pesquisar, ao método tradicional. Em vez de chamarmos a atenção dos alunos que estão na internet ou em algum aplicativo de mensagens – o que mostra que o tema da aula não é interessante para ele –, devemos transformar a internet num aliado. Dessa forma, o aluno se torna o centro da atividade e a aula fica mais prazerosa. Como ganho, há o estímulo ao raciocínio, já que os alunos vão aprender sobre o conteúdo de maneiras diversas e estarão incentivados a buscar exemplos da vida real para demonstrar a teoria. Eles participam muito mais ativamente do processo de aprendizagem.

No momento da apresentação dos alunos, o professor pode anotar os principais tópicos no quadro, fazendo um roteiro ou mapa mental. Eu sempre faço mapa mental e, cada vez que o grupo repete o mesmo tópico, grifo com uma cor diferente. No final, as palavras mais importantes ficam destacadas e evidentes, o que acaba gerando mais discussões.  

Vença a resistência e experimente a sala de aula invertida

Há algumas resistências por parte de professores mais tradicionais, talvez por perceberem que o seu papel tem menor relevância nesse contexto. Porém, devemos entender que o que define a efetividade do professor é a capacidade de assimilação do conteúdo pelo aluno. 

Os tempos mudaram, as pessoas se transformaram, as fontes de dispersão são muitas e o professor ou consultor de treinamento têm de ser criativos e introduzir formas diversificadas de gerar interesse e participação. Ser criativo é deixar de olhar a maneira como fomos educados como a melhor e quebrar alguns paradigmas. E nem sempre a escola ou a empresa – no caso dos cursos e treinamentos voltados para os colaboradores – estão preparadas para isso. 

Um exemplo de aplicação do conceito de sala de aula invertida

Muitas vezes fui criticada não apenas por utilizar o método da sala de aula invertida, mas também por usar artimanhas pouco convencionais, como levar grupos de profissionais para um passeio de barco no rio Tietê. Nessa experiência, os profissionais chegavam ao “porto”, que ficava embaixo do Cebolão (conjunto de pontes e viadutos que liga a Marginal Tietê, a Marginal Pinheiros e a rodovia Castelo Branco, em São Paulo), de olhos vendados. Nesse espaço acumulava-se muita sujeira, e o cheiro era insuportável. Depois que o grupo entrava no barco, falávamos sobre sustentabilidade e meio ambiente. O objetivo era sensibilizar os participantes, criar consciência neles e fazer com que pensassem nas consequências de suas decisões no dia a dia no trabalho e também em casa. 

O debriefing feito depois da expedição era emocionante e observamos mudanças na rotina da companhia. Houve ainda outro ganho: muitos colaboradores que não gostavam de participar de “treinamentos” nem de “aulas” passaram a ligar insistentemente para o RH para que fossem inseridos nas turmas. Isso aconteceu porque quem participava contava entusiasmado para os demais que havia experimentado algo inusitado e marcante, sem dar detalhes. Foi um sucesso a iniciativa.     

Com esse exemplo, finalizo reforçando o convite para que você, professor ou consultor de treinamentos, ponha em prática o método da sala de aula invertida. Ainda que comece em pequenas doses, você vai sentir a diferença. Eu não tenho dúvida de que é a melhor abordagem para uma aula estimulante e um aprendizado efetivo.
 

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