Fit cultural x Add cultural: como contratar para o crescimento

Na integra

Formada por conhecimentos, crenças e valores, a cultura organizacional inclui tanto a cultura atual, que representa “como as coisas são feitas por aqui”, quanto a cultura desejada, que reflete os valores pretendidos pela organização, necessários para agregar valor a seus produtos e serviços.

Sabemos que, para os profissionais de RH, a cultura organizacional é o DNA da empresa, essencial para sustentar sua estratégia. Assim, mapear e gerir essa cultura é crucial para alcançar resultados e comprometimento. No entanto, é um tema complexo, pois há uma tensão constante entre a pressão por resultados e manter o engajamento — um equilíbrio delicado onde o excesso de atenção em um aspecto pode enfraquecer o outro.

Na Integração Escola de Negócios, realizamos uma pesquisa abrangente com mais de 100 equipes, totalizando mais de 2.000 profissionais mapeados. Nosso objetivo foi identificar a existência e a natureza de uma cultura predominante em cada uma dessas equipes.

A pesquisa, intitulada “Cultura de Times: Add Cultural x Fit Cultural“, utilizou a metodologia de mapeamento do perfil de personalidade dos membros das equipes com base na teoria dos cinco fatores de personalidade (Big Five), mundialmente validada para pesquisas científicas. Especificamente, utilizamos o instrumento BIG FIVE BRASIL, psicometricamente validado e desenvolvido para traduzir a personalidade no contexto do trabalho, com um foco específico na cultura brasileira.

Os resultados foram surpreendentes: 80% dos times analisados apresentaram uma cultura predominante. Tais dados, entre outras contribuições, são valiosíssimos para entendermos quando manter o fit cultural (adequação à cultura) e quando trabalhar o add cultural (contribuição à cultura) – termos que explicaremos em profundidade mais adiante neste artigo.

 

O que os dados nos mostram

Em duas equipes avaliadas, observamos uma cultura planejadora predominante, ligada ao controle, atuando na área de operações, nos setores de varejo e financeiro. Para uma cultura de planejamento, esses times estão bem posicionados. Ou seja, manter o fit cultural parece adequado. 

No entanto, se o objetivo é inovação, a empresa tem um problema. Uma solução seria iniciar uma migração para inovação, investindo em desenvolvimento para a equipe atual, além de rever o processo de recrutamento e seleção priorizando pessoas com tendências a comportamentos mais adequados com a cultura desejada, tendo não o fit, mas o add cultural em mente. Além disso, com esses dados em mãos, o RH pode identificar quais são os profissionais desse time que estão fora da curva, ou seja, que possuem perfis mais inovadores e criativos, entrevistá-los e avaliar como agregam ao ambiente, ajudando a direcionar estratégias.

Para citar outro exemplo trazido pela pesquisa, identificou-se também uma equipe com predominância de inovadores. Nessa situação, é importante que o RH assegure a satisfação desses profissionais, oferecendo plano de carreira e desafios constantes, fundamentais para sua retenção. Afinal, inovadores gostam de inovar ou mudar e a empresa deve estar estruturada para atender às expectativas desses profissionais. Ao mesmo tempo, deve também observar se há gaps processuais devido ao alto número de pessoas olhando para o futuro, identificando assim se há a necessidade de trazer perfis mais diversos (práticos ou planejadores) para tais times. Nesse caso, deve também oferecer apoio aos gestores, capacitando-os para liderar um time com diversidade.

Esses exemplos mostram bem a importância do data science para o RH, um planejamento estratégico e cuidadoso, pautado por dados, para se pensar em cultura, especialmente quando falamos em fit cultural e add cultural.

 

Qual a diferença entre fit cultural e add cultural?

O fit cultural e o add cultural são conceitos cruciais na gestão de recursos humanos, especialmente durante o processo de contratação. O fit cultural refere-se à compatibilidade entre os valores, crenças e comportamentos de um candidato e a cultura organizacional existente. Assim, o objetivo é encontrar indivíduos que se integrem facilmente ao ambiente de trabalho, promovendo a harmonia e a coesão da equipe. 

Por outro lado, o add cultural se concentra em mudanças de aspectos culturais da empresa, seja por meio da seleção de perfis diversos, seja na valorização de outros comportamentos por meio das ações de desenvolvimento, com o objetivo de obter melhores resultados estratégicos, melhorar alguns indicadores específicos, obter  novas perspectivas, comportamentos e valores que enriquecem a cultura organizacional. Portanto, trata-se de uma abordagem baseada em people analytics para  promover a diversidade e a criatividade, ajudando a empresa a se adaptar a novos desafios e a inovar.

 

Quais as vantagens do fit cultural?

Integração rápida: colaboradores que se encaixam bem na cultura da empresa tendem a se adaptar mais rapidamente ao ambiente de trabalho, reduzindo o tempo necessário para atingir a produtividade plena.

Maior satisfação no trabalho: quando os valores e crenças de um colaborador estão alinhados com os da empresa, há uma maior probabilidade de satisfação e engajamento no trabalho, o que pode levar a uma menor rotatividade.

Coesão de equipe: um bom fit cultural pode promover um ambiente de trabalho harmonioso, onde os colaboradores se sentem parte de uma comunidade unida. Com isso, facilita-se a colaboração e o trabalho em equipe.

Redução de conflitos: a compatibilidade cultural pode reduzir o potencial de conflitos internos, uma vez que os colaboradores compartilham valores e expectativas semelhantes.

Eficiência nos processos de recrutamento: empresas que focam no fit cultural tendem a ter processos de seleção mais eficientes, pois conseguem identificar rapidamente candidatos que provavelmente terão sucesso e se manterão na empresa a longo prazo.

Consistência na cultura organizacional: manter uma forte cultura organizacional pode ser crucial para a identidade da empresa. Dessa forma, colaboradores que se encaixam bem ajudam a preservar e fortalecer essa cultura ao longo do tempo.

 

Os perigos do fit cultural

Todos nós temos preconceitos implícitos. Afinal, ser capaz de categorizar as pessoas em grupos está entre as primeiras ferramentas que os humanos usaram para sobreviver. No entanto, hoje sabemos que esses preconceitos agora trabalham contra nós. E no caso da cultura de uma organização, eles na verdade prejudicam o sucesso dos nossos negócios.

A cultura é difícil de definir, por isso, quando as empresas contratam para se adequarem à cultura, muitas vezes apoiam-se nos seus preconceitos implícitos, tanto a favor como contra potenciais novas contratações. Como resultado, não raro profissionais de recrutamento e seleção, ou os demandantes da vaga, acabam fazendo a manutenção da cultura selecionando candidatos semelhantes a eles. Assim, um potencial candidato que seja muito diferente do pessoal atual pode ser ignorado porque não se “encaixa”, com base em preconceitos implícitos. Isso priva a empresa dos atributos positivos desse profissional, talentos complementares e da própria diversidade, todos fatores que podem se tornar um diferencial competitivo. Por isso, para apoiar o mapeamento e diferenciação da cultura, empresas vem utilizando instrumentos de assessment, como o Big Five Brasil, utilizado para este estudo.

Outro risco significativo é a homogeneidade de pensamento, onde a falta de diferentes perspectivas pode limitar a inovação e a criatividade dentro da organização. Isso ocorre porque, ao contratar pessoas que se encaixam perfeitamente na cultura existente, a empresa tende a criar um ambiente onde todos pensam de maneira semelhante, o que pode resultar em uma abordagem unidimensional para a resolução de problemas.

Além disso, o foco excessivo no fit cultural pode levar a um conformismo excessivo, com colaboradores se sentindo pressionados a se conformar às normas culturais da empresa, suprimindo suas abordagens e perspectivas únicas para se encaixarem melhor. Com isso, perde-se em inovação e diversidade, com abordagens diferentes sendo vistas com desconfiança.

Outra desvantagem é a possível estagnação da cultura organizacional, que não conta com a introdução de novas perspectivas. Isso é particularmente prejudicial em mercados dinâmicos, onde a capacidade de se adaptar rapidamente às mudanças ou mudança de estratégia organizacional são cruciais para o sucesso a longo prazo.

Finalmente, um foco estreito no fit cultural pode afetar a reputação da empresa. Afinal, em um mundo onde a diversidade e a inclusão são cada vez mais valorizadas, empresas conhecidas por favorecerem um tipo específico de candidato podem ser vistas como exclusivas ou não inclusivas, o que pode prejudicar a atração e retenção de talentos diversificados e danificar a imagem da marca.

 

Add cultural: como surgiu esse termo?

O termo “add cultural” surgiu como uma evolução do conceito de “fit cultural” no contexto de recrutamento e gestão de recursos humanos. Assim, enquanto o fit cultural focava na contratação de pessoas que se encaixam perfeitamente na cultura existente da empresa, promovendo coesão e harmonia, suas limitações tornaram-se evidentes, como a falta de diversidade e inovação.

Foi quando o add cultural surgiu, com o intuito de abordar essas limitações, enfatizando a contratação de pessoas que tragam novas perspectivas e valores, enriquecendo e evoluindo a cultura organizacional. Em pouco tempo, o conceito ganhou popularidade através de publicações especializadas e iniciativas ligadas à diversidade e inclusão, refletindo uma mudança de paradigma que valoriza a diversidade como essencial para a inovação e o sucesso a longo prazo.

 

Quais as vantagens do add cultural

Diversidade de pensamento: o add cultural promove a inclusão de diferentes perspectivas e experiências, o que pode levar a uma maior criatividade e inovação. A diversidade de pensamento permite soluções mais robustas e inovadoras para problemas complexos.

Melhoria de indicadores: é comum a cultura atual trazer resultados positivos a alguns indicadores e negativos a outros. Por exemplo, uma empresa estudada em nossa pesquisa tem uma equipe eficiente na entrega de resultados, porém com um turnover perto dos 80% ao ano. Em um processo de People Analytics comparou-se os benefícios ou custos financeiros destes dois indicadores, somado a um olhar no clima organizacional. Com isso, percebeu-se a necessidade de realizar um add cultural nos líderes destas equipes. Por meio de definição de perfis na seleção das vagas abertas e desenvolvimento dos líderes atuais, optou-se por realizar uma pequena migração de alguns traços do modelo Big Five, tendo assim um melhor clima e desenvolvimento da equipe, com menor turnover, sem perder de vista os resultados.

Capacidade de adaptação: ao incluir colaboradores com diferentes backgrounds e pontos de vista, a empresa se torna mais resiliente e capaz de se adaptar a mudanças no mercado e a novos desafios. Essa adaptabilidade é crucial em ambientes empresariais dinâmicos.

Aprimoramento da cultura organizacional: colaboradores que trazem novos valores e ideias podem enriquecer a cultura existente, promovendo um ambiente mais diverso e inclusivo. Afinal, alguém que desafie o status quo tende a ajudar no crescimento da empresa.

Inovação e crescimento: a introdução de novas perspectivas pode fomentar a inovação e abrir novas oportunidades de crescimento para a empresa. Equipes diversas são frequentemente mais eficazes em identificar e explorar novas oportunidades de mercado. 

Melhoria no processo de tomada de decisão: a diversidade de perspectivas pode levar a uma análise mais completa e uma melhor tomada de decisão, uma vez que diferentes pontos de vista são considerados e debatidos.

Atração de talentos diversos: empresas que valorizam o add cultural tendem a ser mais atraentes para uma gama mais ampla de candidatos. Assim, pode-se expandir o pool de talentos e ajudar a empresa a recrutar indivíduos altamente qualificados que buscam um ambiente de trabalho inclusivo.

 

Perigos do add cultural

Segundo pesquisas científicas realizadas com a teoria de personalidade Big Five, as pessoas tendem a preferir trabalhar com pessoas semelhantes a elas, pois têm maior facilidade de comunicação e identificação. Desta forma, criar uma estratégia de add cultural diversa demais, com perfis opostos, tende a ter menores chances de sucesso, já que estes novos perfis terão mais dificuldade de serem aceitos pelo grupo ou pelos líderes.

Assim, a recomendação é que a estratégia de add cultural parta do mapeamento da cultura predominante, da cultura desejada e das pessoas da organização que estão em posições intermediárias deste caminho. Afinal, provavelmente a estratégia de add cultural irá respeitar alguns limites para que se movimente a cultura gradativamente. Além disso, a pessoa que você contrata ainda deve estar alinhada com os valores fundamentais da sua empresa, sendo capaz de se dar bem com os colaboradores atuais.

Também, às vezes, não há problema em manter sua cultura atual. Afinal, adicionar um elemento que dificultará o entrosamento do time sem objetivo definido e apoio trará mais dificuldades que benefícios. Por exemplo, se a sua cultura é muito colaborativa, trazer uma pessoa altamente competitiva e individualista pode alterar negativamente a dinâmica do time.

É importante considerar ainda outras desvantagens potenciais dessa abordagem. Uma delas é a possível resistência à mudança. Ou seja, colaboradores atuais podem resistir às novas abordagens e valores trazidos por novos colaboradores, o que pode levar a tensões e conflitos internos. Essa resistência pode dificultar a integração e criar um ambiente de trabalho menos harmonioso.

Outra desvantagem é a possível diluição da cultura organizacional. Afinal, ao adicionar muitas novas perspectivas, a identidade cultural da empresa pode se tornar menos definida e coesa, resultando em um ambiente de trabalho inconsistente, onde os colaboradores têm dificuldade em compreender e aderir aos valores e comportamentos esperados. Assim, este é um movimento que deve ser feito guiado por uma estratégia de gestão cultural.

Além disso, a adaptação pode ser um desafio significativo para os novos colaboradores que estão trazendo uma perspectiva diferente. Eles podem se sentir isolados ou não apoiados se suas ideias ou comportamentos não forem bem recebidos ou se a empresa não tiver mecanismos adequados para integrar essas novas perspectivas de maneira eficaz.

Essas desvantagens destacam a necessidade de uma estratégia bem definida e de um equilíbrio cuidadoso entre manter a coesão da cultura existente e enriquecer essa cultura com novas perspectivas.

 

Check-list do add e do fit cultural: 10 pontos fundamentais

  1. Se a cultura atual está entregando os resultados e engajamentos necessários, estratégias de fit cultural são o caminho mais natural e eficaz.
  2. Se há aspectos de desempenho que precisam ser melhorados ou alinhados com novas estratégias organizacionais, adotar estratégias de add cultural é fundamental.
  3. Sim, equipes tendem a funcionar melhor com pessoas semelhantes. No entanto, é importante observar o processo de homogeneização do grupo, que, embora natural, pode ser danoso, num fenômeno que chamamos de “espelhocracia”.
  4. Em seu projeto de gestão da cultura, ao mapear a necessidade de mudanças culturais, evite contratar pessoas com culturas opostas à do time atual.
  5. A melhor abordagem é introduzir perfis com diferenças mais suaves, mas alinhados à direção desejada pela estratégia da empresa.
  6. Ao mapear o perfil dos times e dos indivíduos, considere: Existe uma cultura predominante? Quem possui perfis ligeiramente diferentes? Quem são as pessoas completamente diferentes da cultura predominante?
  7. Entrevistem essas pessoas, analisem seu desempenho e interação com os times, e utilizem essas informações para definir estratégias de ADD Cultura.
  8. Líderes e subordinados tendem a apresentar culturas semelhantes, mas pode ser necessário que líderes possuam comportamentos diferentes das equipes.
  9. Diversidade é sempre o melhor cenário, porém, não é simples. Para que a diversidade seja eficaz, é necessário haver confiança e entrosamento entre líderes e suas equipes, além de líderes com alta maturidade e capacidade de liderança.
  10. Para haver diversidade ou add cultural é necessário líderes com alta capacidade de liderança e maturidade de comunicação, confiança e relacionamento.

Em conclusão, enquanto o fit cultural e o add cultural oferecem abordagens distintas para o recrutamento, ambos são essenciais para o desenvolvimento de uma organização saudável e inovadora. Por isso, os gestores de RH devem tentar equilibrar a busca por candidatos que se alinhem com os valores fundamentais da empresa com a inclusão de indivíduos que trazem novas perspectivas e habilidades – mas sempre a partir de um olhar estratégico.

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