Artigo escrito por Fernando Cardoso, sócio-diretor da Integração Escola de Negócios e Conquistar, ex-conselheiro do CRA-SP, autor e palestrante com mais de 15 anos de experiência em estudos de personalidade, autoconhecimento e liderança.
Caminhamos em uma linha evolutiva impressionante. Como diz Peter Diamandis em seu livro “Abundância”, vivemos em uma maravilhosa era de recursos abundantes. Essa trajetória, no entanto, não foi algo fácil – e segue sendo cada vez mais desafiadora. A régua não para de subir e os padrões se mantêm cada vez mais elevados.
O que mudou no mercado de trabalho apenas na última década? Algumas empresas estão crescendo exponencialmente, outras encerrando suas atividades, vemos o surgimento de serviços, assim como novas tecnologias e possibilidades, até os padrões de se vestir estão diferentes, isso citando só alguns exemplos.
Você consegue imaginar um mundo sem computadores, celulares ou Wi-Fi. Difícil, não? Pois assim era a infância deste que vos escreve. Isso não faz nem 40 anos (a internet, por exemplo, foi oficialmente ”inventada” em 1983).
Líder: um atleta do mundo executivo
Repare no futebol. Antigamente questões como sobrepeso, pouca massa muscular, alimentação errada ou mesmo o uso do tabaco eram irrelevantes. Fiava-se no “talento”, no dom daquele que “nasceu para jogar bola”.
Hoje o “joga bonito” sozinho não ganha título. O atleta precisa trabalhar próximo ao limite do seu corpo e utilizar todo conhecimento e tecnologia disponíveis para potencializar o seu desempenho. Dieta adequada, suplementos, fortalecimento muscular, treinos táticos e técnicos, sem contar o acompanhamento multidisciplinar, envolvendo médicos, fisioterapeutas e psicólogos.
O mesmo acontece no mundo executivo e na liderança.
Há algumas décadas, eram aceitáveis frases como “só preciso um par de mãos” ou “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. A área de Recursos Humanos já foi um dia apenas “departamento pessoal”.
Hoje trabalhamos com conceitos como colaboração, diversidade, humanização, autonomia, construção participativa. “O computador é uma bicicleta para o nosso cérebro”, já dizia Steve Jobs. Ou seja, da mesma forma que nossas capacidades físicas e mentais se multiplicam, atividades que pouco exigem do cérebro gradativamente passam a ser executadas robôs, computadores e inteligência artificial.
A expectativa é que até 2025, mais de 85 milhões de empregos no mundo sejam substituídos por automação e no mesmo período outros 97 milhões de empregos mais complexos serão criados, segundo relatório do Fórum Econômico Mundial de 2020.
Nunca se exigiu tanto dos líderes – e do cérebro
Neste universo automatizado, competências como pensamento analítico, inovação, criatividade, liderança, influência, pensamento estratégico, inteligência emocional e habilidade de resolução de problemas complexos passam a valer ouro, e são chamadas de competências do futuro.
Nunca se exigiu tanto da liderança como hoje. Para a construção de relações, alinhamento dos times, lidar com incertezas, busca por propósito, criação de equipes automotivadas, com alto desempenho e inovadoras, além da manutenção de questões como segurança psicológica, felicidade no trabalho, diversidade e, claro, entrega de resultados.
Com isso, também nunca se exigiu tanto do cérebro humano.
Neste cenário, o líder que busca atingir um desempenho excelente, equilíbrio na vida ou mesmo evoluir como ser humano, em uma cultura que tanto exige de nossas habilidades comportamentais, precisa necessariamente entender como o cérebro funciona.
A relação entre a neurociência e uma liderança de sucesso
O cérebro é indiscutivelmente o órgão mais faminto do corpo, consumindo cerca de 20% de sua energia por dia (o coração consome 10%).
Uma de suas partes mais importantes, representando aproximadamente metade do volume do cérebro, é a região chamada de neocórtex. O neocórtex é responsável, entre outras coisas, por nossa capacidade de visão de futuro, planejamento e por nosso pensamento consciente. Ou seja, uma parte bastante ativa no dia a dia de um líder, com um importante papel no processo de tomada de decisões de forma prática e estratégica.
A questão é que quase 95% dos nossos comportamentos não são determinados por nosso consciente, mas sim pelo nosso inconsciente (Bargh & Chartrand, 1999). Ou seja, pelas emoções e sentimentos. O pensamento consciente fica, assim, com apenas 5% de influência em nossas tomadas de decisão.
Se o líder e todos que o rodeiam são regidos em quase 95% por seu inconsciente, por suas emoções e sentimentos, como construir a partir daí relações mais frutíferas, obter melhores resultados do meio e se desenvolver?
A resposta passa pela neurociência e por ampliarmos nosso entendimento sobre o ser humano e sobre como navegar nas questões de relacionamento e comportamento com outras pessoas e com nós mesmos.
É preciso ter em mente que o cérebro é uma “máquina” maravilhosa, que representa uma das evoluções mais potentes da natureza e que possibilitou ao ser humano atingir o topo da cadeia alimentar. Porém, essa “máquina” também possui certas limitações e é cheia de vieses. Por isso é tão importante para uma liderança de sucesso entender um pouco melhor como o cérebro funciona.
O papel do consciente e do inconsciente
Como expliquei acima, nosso sistema mental funciona a partir da ação de nosso inconsciente e consciente. O primeiro nos motiva, dirige e determina o que é importante para nós, reagindo a diversas situações. O segundo, representado pelo neocórtex, tenta prever a consequência de nossas ações, identificando situações semelhantes às já vividas, e procurando obter melhores resultados de nossas atuações no meio.
Liderança é uma atividade prioritariamente social, que exige saber se relacionar com o outro, obter o melhor das relações e da cooperação. Mas como exercer tal atribuição sendo regido por um cérebro baseado em reconhecimentos de padrões e dominado pelas emoções inconscientes? Tão cheio de preconceitos e vieses, tanto em você líder, quanto nos indivíduos da sua equipe?
Uma excelente forma de ilustrar este cenário é com um dito popular: “não existe uma verdade e sim três, a sua versão, a minha e o fato”. Pois nossa “verdade” nada mais é do que nosso olhar, referências, padrões e pontos de vista, influenciados por nossos desejos mais profundos. Grande parte deles, inclusive, desconhecidos por nós mesmos.
Como eliminar tantos vieses, agir de forma justa e encontrar o equilíbrio nas relações?
A resposta simples e objetiva é o autoconhecimento. Precisamos ter consciência do mundo à nossa volta, das consequências de nossos atos, comportamentos e decisões. O problema? Fica difícil estar ciente de tudo ao redor quando o inconsciente trabalha mais rápido e decide tudo por nós (Raymond Kurzweil, 2012).
Racionalidade acima de tudo?
Como seria um gestor desprovido de suas emoções, sutilezas, sensibilidade e intuição? Certamente não um bom líder.
Estudos feitos com pessoas que tiveram danos cerebrais e que ficaram desprovidas de emotividade mostram que a ausência de emoções tem um efeito negativo na vida cotidiana. Em muitas o que se viu foi uma incapacidade de tomada de decisão, ausência de empatia, pouca capacidade criativa, dificuldade de manter relações, de articular soluções, de motivar, engajar e de lidar com a subjetividade, capacidades tão atuais e necessárias na liderança hoje.
O mesmo efeito negativo podemos ver no extremo oposto. Imagine uma pessoa inundada de emoções, sem a capacidade racional de planejar, pensar no futuro, prever situações e consequências, aprender e não repetir alguns erros, ponderar e se conter. Fica igualmente difícil liderar sem tais habilidades, não?
A resposta para uma liderança de sucesso, então, é o equilíbrio. Ou seja, é confiar em nosso sistema mental da forma como é, com o consciente e o inconsciente se complementando de forma perfeita – como tudo na natureza.
Como encontrar o equilíbrio para uma liderança de sucesso
Esse importante processo de autoconhecimento pelo qual todo líder deve passar gira em torno de entender que temos dois sistemas trabalhando conjunta e simultaneamente.
O inconsciente nos rege, influencia fortemente nossas decisões e em alguns momentos nos domina 100%. É a tal da “resposta rápida”, segundo algumas literaturas. Só que essa “resposta rápida” às vezes é demasiadamente pautada por nossas emoções, sendo baseada em dados incompletos ou imprecisos. Isso pode conduzir o líder a atitudes como decisões erradas, leitura equivocada de tendências, procrastinação e falta de habilidade de relacionamento. Como resultado, pode haver uma desunião ou desmotivação do time.
O processo de autoconhecimento sob a perspectiva da neurociência é entender que precisamos elevar o protagonismo do consciente, sem dúvidas. Mas não torná-lo senhor dos nossos atos.
A intenção é que, sabendo do poder que o inconsciente exerce sobre o ser humano, você possa então trabalhar certas respostas para ter atitudes mais equilibradas. Isso envolve a ponderação, a reflexão, ganhar tempo em algumas decisões e conter alguns impulsos. Além disso, deve se questionar sobre seus vieses inconscientes e preconceitos, buscando neutralizá-los em alguma medida.
Não se trata de mudar nossa personalidade, nossa natureza. Até porque a essência de cada indivíduo é algo belo e único. O que podemos fazer é aprender, entender por que o mundo reage a nós da forma que reage, que tipo de “frutos” temos colhido e como influenciar nós mesmos e o meio em que vivemos para obter melhores resultados. Esse é o papel do nosso neocórtex, ou seja, do consciente. Afinal, é o nosso pensamento racional que busca resultados melhores da vida, nos permitindo aprender com os erros.
Para isso, inúmeras técnicas e ferramentas estão ao nosso alcance. Estar atento, presente e concentrado é uma delas. Conhecer a si próprio, incluindo seus vieses e preconceitos, é outra.
Identifique diferenças e complementaridades
Uma das ferramentas mais importantes para uma liderança de sucesso é a de saber reconhecer as diferenças entre as pessoas. Acredite ou não, perceber e ter claro que os indivíduos são genuinamente diferentes não é algo intuitivo. Assim, essa é uma tarefa ligada ao nosso consciente. E é um entendimento que amplia profundamente nossos horizontes.
Um líder que percebe as diferenças pode tratar cada um de forma mais adequada, desafiando cada membro da equipe de maneira mais coerente com sua natureza. Mais importante, é capaz de descobrir as complementaridades existentes no time – incluindo aquelas em relação ao próprio gestor.
Como você lida com quem é diferente de você? Você rejeita ou aceita, valoriza ou despreza, admira ou inveja, busca o diálogo ou se afasta?
Ter consciência destas diferenças pode ser libertador. É uma atitude que nos traz sabedoria, e, além das possibilidades já descritas, um modo de obter o melhor de cada um. Além disso, nos permite um desenvolvimento pessoal e profissional riquíssimo. Afinal, reconhecendo as diferenças, podemos aprender com elas.
Dessa forma, identifique as pessoas opostas a você, observe suas qualidades, busque conselhos, convide-as para serem suas mentoras (e vice versa). Ademais, procure discutir as diferenças, negociando estratégias de relacionamento e complementaridade.
Muito provavelmente também verá nessas pessoas características que despreza. Para uma liderança de sucesso, a dica então é ser tolerante pois juntos dos “defeitos” estão as qualidades, as quais podem passar despercebidas caso não esteja atento.
Na verdade, essa troca é a complementaridade perfeita: você apoia e ensina as pessoas opostas a você no que lhes falta e vice-versa.
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